Sou uma pessoa de poucos amigos é meu jeito, sou reservado, complicado e penso que é ok ser assim, e depois, acostumei-me ao isolamento e vivo bem dessa forma. Ontem (31/07/19) um amigo partiu. Não tive com ele histórias de amigos que vivem uma vida inteira juntos. A considerar o tempo que andamos afastados, poder-se-ia dizer que amigos tem um laço afetivo muito mais estreito do que tivemos, mas em algum momento de minha vida, isto transcendeu. A mesma relação tenho com outros verdadeiros amigos.
Alexandre Brum seu nome, Bola Sete era como a maioria o chamava. Conheci-o criança, éramos quase vizinhos, morávamos em ruas paralelas, encurtadas por um terreno baldio que unia uma rua a outra. Na rua onde ele morava com seus pais e sua irmã, havia um bar de secos e molhados, ficava quase ao lado de sua casa. Não recordo exatamente como tudo começou, erámos crianças, mas muito provavelmente foi por causa do bar, além disso éramos sócios do Caixeiros Viajantes, um clube social da minha cidade, logo nos conhecemos e ficamos amigos.
Ia em sua casa quase todos os dias, era tão da família que tinha acesso livre e entrava pela porta dos fundos sem sequer bater, bastava puxar a cordinha que liberava a trava da porta e entrava pela cozinha, era a minha segunda casa. Já naqueles tempos o via com curiosidade e uma certa admiração. Fazia o que lhe dava vontade, não que eu não pudesse, mas sempre fui comedido, o Bola não era. Seu quarto tinha o teto repleto de bolinhas de papel. Ele deitado na cama, eu sentado em uma cadeira, entre uma conversa e outra ele lançava as bolinhas de papel que mascava, com um tubo de caneta bic, tal qual uma zarabatana.
Seus pais eram pessoas admiráveis, tenho deles várias lembranças. Sua mãe conseguiu vaga para que eu estudasse no colégio estadual Júlio de Castilhos, um desejo adolescente que realizei, quis o destino, seja lá como chamam isto, que minhas tentativas de educar-me não resultasse em coisa alguma, no entanto os três anos que frequentei o colégio mudaram a minha visão de mundo. Conheci diversas pessoas, algumas continuam fazendo parte de minha vida, ainda que distantes.
O Alexandre também foi aluno do Julinho, um dos motivos que fizeram com que desejasse estudar lá. O Bola estava em todas; festas, bailes, grêmio estudantil, trabalhei com ele em alguns eventos fazendo projeções de slides em bailes. Frequentei o clube do professor gaúcho, levado por sua mãe, carnavais no Caixeiros, baile dos magrinhos, a piscina do clube onde ele dava saltos “ornamentais”, estilo próprio. Ele também me visitava, um tanto desajeitado, tinha talento para acidentes domésticos. Acampamos juntos, bebemos todas, fumamos muito, ouvíamos muita música. Perdi o contato quando ele começou a trabalhar como funcionário público. Eventualmente cruzávamos pela cidade.
O que sei dele e o que compartilhamos daria para escrever um pequeno livro. Nos últimos anos nos aproximamos novamente. Falávamos por mensageiros, eventuais ligações, prestei serviços profissionais para ele, e saímos algumas vezes.
Descobri nestes últimos anos, que não só eu tive o privilégio de conhece-lo, no meio radialístico fez muitos amigos, muitas pessoas tem por ele carinho e admiração. Não lembro de uma única vez em que estivesse triste. Não tive a oportunidade de estar com ele e a sua irmã no falecimento de seus pais em diferentes ocasiões, talvez então tivesse presenciado um momento seu de tristeza, nesse momento lamento não ter estado com ele.
Minha vida seria diferente por certo se não o tivesse conhecido, fará falta, já faz, penso que isto também se deu com outras pessoas, tinha um astral elevado. Não tinha ruim para ele, estava sempre pronto para qualquer coisa. Haviam planos para futuros encontros, mas sua morte precoce … uma puta sacanagem!
Nunca o vi queixar-se, tenho pra mim que o Bola viveu a vida que desejava. Era capaz de andar 200 km – ida e volta – apenas para comer pastéis, não conheço outro que faria nada parecido. Ele era assim para tudo aquilo que desejasse fazer.
Mais que amigo, Alexandre era um ser iluminado, creio que por este motivo não sofreu, a vida logrou a morte. Agradeço aos céus por tê-lo conhecido, enquanto tiver sanidade vou lembrar dele com alegria, penso que não admitiria ser lembrado de outra forma.
Foi um orgulho tê-lo em minha trajetória de vida.